Para sempre

       

        Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.

        É grandioso. Tenho uma estrela escolhida para ti, com o teu nome, com o meu nome. É retirada de uma bandeira que guardo na parede do meu recanto. Eu nunca gostei de estrelas, nunca gostei da simetria. Mas esta és tu e os seus adornos foram para ti.
        Estou num parapeito e ouço as palavras que nunca pensei ouvir, não nesta altura, não agora que o amor parecia ter deixado de existir, não agora que a rua estava deserta, não agora que eu era vazio. Mas as palavras.

        Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.

        Apeteces-me. Gosto de ti. Neste parapeito gosto de ti com uma imensidão que me ultrapassa. O meu ouvido trabalhador ouve as palavras e o teu timbre está por detrás de toda esta minha saudade. Doem-me os braços neste parapeito, mas é de noite e estou tão perto de ti, estás à distância de dois prédios, estás aqui mesmo ao meu lado. Quase que te sinto a abraçar-me. Quase que me sinto a abraçar-te. É largo o nosso abraço. Remete-nos para uma eternidade que não queremos terminar. Cresce sempre mais um pouco, como se nós conseguíssemos ser sempre muito mais do que somos.
        As gargalhadas são efémeras, mas não ao pé de ti, ao teu lado os meus sonhos são a vida inteira, são pétalas de uma flor que não foi inventada, são crianças que ainda não aprenderam, são uma pulseira azul numa pele morena, são violinos que choram sem cordas. Ao pé de ti, as possibilidades são encontros que se dão. Cigarros que se fumam na pressa de existirmos. Conversas que fluem por terras de gastronomia. És um encanto que se vê. Apeteces-me.
        E aquelas letras todas a entrarem para dentro de mim.

        Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.
       
       Trouxeste de volta a mim toda a candidez que havia perdido. Sou de novo um ser que ousa. E foi preciso tão pouca coisa. As tuas linhas faciais, as tuas unhas azuis, os teus olhos contornados a negro, o teu sorriso de elegância e perfeição, o teu nariz de pequenez, o teu apetite, as tuas calças rasgadas, os teus cotovelos visíveis, os teus dentes de simetrias, o teu furo de orelha singular, o teu gesto de me abraçar, a tua demora no abraço, as tuas palavras, as nossas palavras.

        Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.

        E a palavra sempre tem sempre um sentido temporal que não existe. Quando sempre representa a eternidade, o limite da nossa carga humana. O sempre é todos os dias. E eu quero dar-te as mãos todos os dias. Mas também fico feliz com um abraço, desde que tenha a finitude que bem entendermos.

         Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.

        Quero antes de tudo saber como são os teus olhos, a cor exacta, a certeza de que serão parecidos com alguma flor, um horizonte, uma paisagem.
        Tenho as coisas mais simples para te mostrar. Já te encaminhei para tudo. Falta tu andares. Faltam os teus passos em direcção a mim e a tudo o que me engloba. Quando começares a pisar o mesmo chão que eu, seremos tudo. O que nos fará falta será apenas tudo aquilo que ninguém ousou escrever. Mas até isso eu escreverei, serei o teu poeta, o teu romancista. Descreverei a terra, o ar, o céu, as nuvens, a chuva, o espaço. E até as estrelas que nunca brilharam eu escreverei, dar-lhes-ei vida e todas elas terão o teu nome, o meu nome, o nosso nome.
        Para sempre.
        Sempre. Mesmo quando as estrelas deixarem de brilhar.

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