Não vou esquecer





Estou diante das únicas palavras que me escreveste em 4 anos. Na segunda página de um livro de Lobo Antunes, estão resquícios de ti. Não é muito. É o suficiente para que me doam os olhos que se embargam só de virar a página. É o suficiente para que nunca entres no esquecimento dos dias. Restos de ti.
            O livro continua aberto. Estou no sofá, mas ainda estou a pensar nas palavras que lá deixaste, no livro, no Lobo Antunes. Leio muitas vezes na esperança de encontrar um novo sentido para o que escreveste. Reparo que não usaste acentos. O i sem a pintinha. O Parabens sem o chapéu. Os aninhos a lembrarem-me que sempre foste de diminutivos. O amo-te muito com toda a certeza que hoje duvido.
            O Lobo Antunes que sempre foi um dos meus escritores preferidos. Agora, não o suporto. Não suporto a ideia de que as palavras do António me lembrem de ti, me lembrem que me fugiste, que me foges, que me desapareces. No entanto, volto ao António. Volto ao Antunes para abrir a segunda página. Para ler outra vez as únicas palavras que me escreveste em 4 anos.
           
            Há dias em que tenho vergonha da minha memória. Nesse lugar que só eu posso visitar, posso ver-te a vestires-te pela manhã. A tua nudez. O teu corpo que não tinha coragem de me despedir. Os teus seios que queria sempre sentir antes de acordar. O teu cabelo que via sempre despenteado. A tua boca que me deu beijos que nunca mais encontrei. Os teus braços caídos, pela manhã, pela manhã, pelo corredor.
            A minha memória não devia acontecer.
            A minha mão passa pelo papel que guarda as tuas palavras e volto a ter-te aqui. As tuas palavras são o que resta. E eu guardo tudo o que resta.
            Estou novamente de livro aberto. Na segunda página.
            Porque me deste os Parabens sem chapéu? Será que eu não era completo e me faltava alguma coisa? Eu estive lá, eu estou lá, eu estou lá. Não existe um único dia que não estivesse. Eu estive lá. Eu estive lá.
           
            As minhas mãos querem as tuas palavras em relevo, para que me voltes a chamar: Bernardo. Bernardo. Bernardo.
            Tenho tantas saudades da tua chamada. E eu juro que nunca me vou esquecer. Tenho tantas saudades de ver a minha cabeça encostada às tuas pernas, a tua magreza no meu pescoço e eu a ver-te ao contrário, mas ainda assim, tão bonita.

            As tuas únicas palavras escritas. Terminam como teu nome. E eu não sei mais nenhum nome. Eu decoro o teu nome. Descubro agora que só tens uma vogal no teu nome. Uma vogal repetida, muitas vezes repetida. Tens o nome mais bonito do mundo. E eu sempre pensei que Bernardo seria perfeito ao lado das tuas vogais.
           
            Tenho vontade de me ajoelhar. De me arrepender da vida que tive, que tenho tido. Mas tu surges como um futuro que tarda em emergir. Tudo parece impenetrável porque os meus ossos não conseguem tapar a minha memória e eu continuo a chorar. A chorar. Não voltei a deixar de chorar.

            E eu prometo que não vou esquecer.
           
            Prometo que não vou esquecer o António Lobo Antunes sentado na Feira do Livro, com o ar de arrogância a assinar livros. Prometo que não vou esquecer a tua presença. Prometo que não vou esquecer quando te sentaste ao lado do António Lobo Antunes e pediste o meu nome escrito pela caneta dele. Prometo que não vou esquecer quando me entregaste o livro e as tuas palavras. Prometo que não vou esquecer que és o amor mais bonito de sempre. Prometo que nunca vou apagar as únicas palavras que me escreveste.

Comentários

  1. "A diferença entre o razoável e o bom, é um pequeno esforço extra.
    Somos o que fazemos repetidamente. Por isso o mérito não está na ação e sim no hábito.
    Conhece os teus limites, mas nunca os aceites.
    Nunca se sabe que resultados podem vir das nossas ações. Mas se tu não fizeres nada, não existirão resultados.
    O êxito na vida não se mede pelo que conquistamos , mas sim pelas dificuldades que superámos no caminho da reconquista.
    A reconquista é a oportunidade de começar tudo de novo - inteligentemente
    Não consultes os teus medos, mas sim as tuas esperanças e sonhos. Preocupa-te não com o que falhou, mas com aquilo que ainda é possível tu fazeres.
    Quem deseja , encontra uma forma de ter o tão desejado. Quem não deseja fazer nada, encontra uma desculpa.
    As pessoas dizem frequentemente que a motivação não dura. Bem, nem o banho - e é por isso que ele é recomendado diariamente.
    Um vencedor nunca desiste, e quem desiste nunca saberá o que é ser um vencedor."

    Bernardo,

    O teu texto é lindo e os teus sentimentos também. Pensa nas palavras que "abusivamente" aqui te deixo, tenho a certeza que saberás geri-las da melhor maneira!

    R.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares